José Renato Nalini
Ninguém é inocente para acreditar que as coisas são como parecem ou como se apregoa que elas são. Sou adepto das redes sociais, entusiasta com a 4ª Revolução Industrial, ávido para assistir algumas das promessas que aqui tardam a chegar, mas que já estão disponíveis em espaços mais civilizados. Mas não deixo de reconhecer que a preservação de valores ameaçados é uma luta renhida e desigual.
Uso todas as vantagens da comunicação online instantânea. Vibro com ela. Sou obrigado a reconhecer que ela se presta a todos os fins. Os bons e, prioritariamente, os maus.
O mundo está a evidenciar que há riscos insuspeitos na web. Examine-se o que acontece com Maria Ressa, a filipina considerada uma das Pessoas do Ano em 2018. Ela fundou, preside e trabalha no site de notícias Rappler, criado em 2012. Começou a verificar que a acenada “guerra contra as drogas”, em seu país, causava mais prejuízo do que vantagens. Desde 2016, foram mais de doze mil mortos. Quase todos crianças ou jovens.
Quando começou a divulgar esse quadro dantesco, Maria chegou a receber noventa mensagens de ódio por hora em sua conta do Face, além de ameaças de morte e estupro. Não se calou e, ao reforçar o valor jornalístico da coragem e da verdade, entendeu que é a única maneira de resistir aos 3 Cs: Corrupção, Coerção e Cooptação. Ao participar de um debate em Doha, no Catar, sob o tema “Como combater a demonização da imprensa”, atribuiu a perseguição não apenas ao governo, mas também ao Face, que monopoliza 97% dos usuários nas Filipinas. Para ela, as redes sociais têm de drenar o lodo tóxico se quiserem sobreviver.
O perigo dos algoritmos é que eles tratam a verdade e a mentira de forma idêntica. Admitem os chamados “trolls patrióticos”, a serviço de autoritarismo, disseminadores de ódio online. Assassinam reputações, viralizam mentiras e manipulam as mentes. É a velha fórmula por todos conhecida: repete-se uma inverdade até o infinito e ela vira verdade.
Insuficiente apurar as mentiras e fazer com que elas deixem as redes. É preciso alertar os incautos e mostrar a origem da mentira.
Esse o lado perverso, para não dizer o lado podre, de tecnologias tão poderosas e facilitadoras de nossa vida.
José Renato Nalini é
autor de “Ética Geral
e Profissional” e
presidente da Academia Paulista de Letras