Início Opinião A difícil relação entre os poderes da República

A difícil relação entre os poderes da República

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Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

O governo e o Congresso Nacional dão mostras de absoluto antagonismo, que poderá levar ao impasse os projetos em andamento. O Poder Judiciário (STF, TSE e STJ), por seu lado, extrapola de sua seara e insiste em legislar e usar mão-de-ferro que contraria a cultura e as normas democráticas. Noticia-se frequentemente que, não dispondo de base parlamentar suficiente para aprovar suas matérias, o governo oferece emendas parlamentares e cargos no Executivo a deputados e senadores – especialmente os do Centrão – que se disponham a votar junto com a bancada governista. É a sobrevivência da maioria fisiológica adquirida a peso do dinheiro público ao longo de sucessivos mandatos, prática que já produziu fatos de triste memória, como o mensalão e outros, eventos constantes da crônica policial-judiciária permeada de notórias figuras de colarinho branco e bolsos cheios de dinheiro sujo.
E o pior é que, quando o governo tenta parar a barganha – isso já aconteceu em alguns períodos – ocorre aquele tipo de rebelião branca e a sinalização de que seus projetos ficarão travados. Só voltam a caminhar depois da negociação e do devido molhar de mãos. Essa prática é uma das razões da imagem tão desgastada com que a classe política é vista perante a população e, até, dos processos judiciais que impedem muitos parlamentares de terem uma atuação mais independente e voltada aos interesses da comunidade. Espera-se que o novo parlamento, empossado em 1º de fevereiro, mais conservador que o anterior, tenha mais força para recuperar sua autonomia, enfrentar e combater as invasões que os outros poderes frequentemente fazem às suas prerrogativas e, finalmente, atuar no interesse do povo que o elegeu.
É muito ruim um mandato começar com tantas CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito). Mas é necessário compreender que estamos vivendo um momento crítico da vida política nacional e os fatos exigem apuração e providências. Espera-se que a parcela respeitável de congressistas encaminhe os inquéritos de forma republicana. Que atuem no interesse da instituição pública e não de segmentos políticos ou ideológicos que, nesses anos que se passaram, optaram por polarizar o debate e tentar ganhar suas teses no grito.
O governo – inclusive o presidente – têm de conter a emoção para evitar que o rancor e o desencontro inviabilizem as possibilidades de convivência entre os diferentes. O Judiciário deve recolher-se às suas tarefas constitucionais e evitar ações políticas, ideológicas ou pautadas fora da boa prática forense. Ministros, desembargadores, juízes e o Ministério Público, de alto a baixo, têm sobre seus ombros a importante missão de fazer cumprir a Constituição e o ordenamento jurídico dela decorrente ou por ela incorporado. É um desperdício ter julgadores atuando politicamente e, principalmente, executando tarefas que não são da responsabilidade de seus postos.
É verdade que temos dificuldades de definição. A começar pela Constituição, um texto de inspiração parlamentarista que tem de servir ao regime presidencialista definido no plebiscito de forma de governo instituído pela própria Carta Magna. A prática política dos 35 anos que nos separam da entrada em vigor do texto constitucional nos conduziu ao quadro hoje reinante onde tanto o Executivo quanto o Legislativo têm suas forças contestadas e muitas vezes contrariadas. É preciso resolver esse quadro perverso porque só assim voltaremos a viver em paz.
Já tivemos a oportunidade de dizer que, a cada dia que passa, o Brasil necessita mais de “bombeiros” para apagar o fogo institucional. Todas as lideranças, de situação, de oposição e de centro têm o dever de trabalhar na direção da pacificação; sem isso, o futuro será incerto, lamentavelmente.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves é dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo (Aspomil)

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