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Quando a militância é destrutiva

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Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

Tem sido uma incômoda realidade a proliferação de “rótulos” que, em vez de ajudar, acabam prejudicando os indivíduos – especialmente certos profissionais – em cujas costas são aplicados. É difícil compreender a existência de juízes, promotores, jornalistas, comentaristas e outros titulares do direito de opinar que sejam declaradamente direitistas, esquerdistas, lulistas, bolsonaristas ou seguidores de qualquer outra tendência que possa se extremar. O que a sociedade deles espera é equilíbrio e discrição à altura do que desencadeiam com suas atividades. Não devem esses senhores e senhoras atuar como militantes, principalmente aqueles de cuja penada podem surgir efeitos sociais ou econômicos. O juiz e o promotor, independente do que pensam e desejem no ponto de vista ideológico, têm de ser escravos da lei e jamais tentar mudar sua interpretação porque isso é função do Poder Legislativo (senadores, deputados e até vereadores), mas nunca do Poder Judiciário.
O jornalista, radialista e seus assemelhados, também devem se abster da vinculação e do que é ainda pior: a subordinação a ideologias, políticos ou grupos. O bom exercício da profissão costuma ser mais eficaz que os mandatos eletivos e à vinculação ou parceria com seus titulares.
Nada impede que o magistrado, o promotor, o jornalista ou qualquer outro profissional tenha suas simpatias. Mas, pela natureza das atividades que exercem, nenhum deles deve ser militante. No momento em que assumem qualquer dos lados, estarão limitando suas competências e liberdades de ação, tornando-se reles integrantes de uma das facções e perdendo a independência de decisão. Quando decidem, embora possam fazê-lo, sempre provocam a desconfiança da comunidade e até contestações. Poderíamos citar dezenas, ou centenas, de decisões que padecem desse problema, mas não é necessário, pois todos as conhecem suficientemente para fazer juízo.
A sociedade e a constituição política são resultantes de ciências e teses vindas da Europa e de outras nações que se desenvolveram e tornaram-se potências e exemplo. Na formulação política brasileira temos o híbrido vindo da democracia e outras vertentes, especialmente o parlamentarismo. Os veículos de comunicação, embora criados sob inspiração e muitas vezes até para sustentar candidaturas, foram levados a posar de independentes quando nada deveria impedir que atuassem atrelados às vertentes que determinaram sua criação sem, contudo, esconder essa condição. O certo é que, com o correr dos anos e das mudanças políticas, todos tornaram-se oficialmente “independentes”. Por força das atividades políticas, muitos de seus profissionais foram cooptados por segmentos políticos que hoje os impedem de serem simplesmente bons prestadores de serviços na área em que atuam.
Carecemos de definições e comportamento ético. Não pode ir bem uma nação onde julgadores e operadores do Direito são militantes de qualquer lado da ideologia. Da mesma forma, é inconveniente que os responsáveis pela comunicação tenham militância e ela interfira no seu trabalho por onde passam temas e interesses de todas as tendências. Infelizmente, enquanto não se decidir essa divergência (se profissional ou militante), jamais alcançaremos a paz política e social que, a cada instante, mais se fragiliza.
Nessas e até em outras áreas, é difícil, praticamente impossível, ser profissional e militante; o ideal é fazer a opção por uma ou outra atividade.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves é dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo (Aspomil)

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