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A dor e a crise dos opioides nos EUA

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Fernando Rizzolo

Desde que a humanidade existe, o homem sofre com o efeito colateral de viver num corpo no qual as mais variadas reações se dão por conta de diversas doenças, muitas delas incuráveis. Como efeito de sucessivas guerras mundiais e do avanço das drogas anestésicas com a finalidade de realizar cirurgias, a indústria farmacêutica mundial, juntamente com pesquisadores, desenvolveu drogas eficazes no combate à dor que, de forma paralela, acompanha também tratamentos oncológicos e que têm por finalidade amenizar o sofrimento da humanidade.
O grande problema, principalmente nos EUA, é que ironicamente essa busca para evitar a dor trouxe um enorme sofrimento para aquele país, uma vez que as mortes por overdose dessas drogas chamadas opioides (potentes analgésicos, geralmente mais potentes que a morfina) quintuplicaram nas últimas duas décadas.
Mas qual seria a razão para os médicos americanos se associarem a uma das mais altas taxas de prescrições de opioides? Sabe-se que, no final da década de 1990, a Veterans Health Administration, que administra assistência médica aos veteranos militares, pressionou para que a dor fosse reconhecida como o “quinto sinal vital”. Isso deu à dor o mesmo status da pressão arterial, frequência respiratória e temperatura. Isso passava a ideia clínica de que a dor estava sendo “subtratada”, ideia essa difundida também pelo “núcleo da agenda de marketing das empresas farmacêuticas”.
No Brasil também não é diferente. Muito embora as prescrições sejam feitas com maior parcimônia, existe o uso recreativo dessas drogas ou casos de pacientes que vivem na condição de dependentes, que procuram com frequência unidades de pronto atendimento queixando-se de fortes dores para terem acesso aos opiáceos. Para piorar a situação, no Brasil, já se tem notícia de apreensões de lotes irregulares de Fentanil, um opioide 50 vezes mais potente que a heroína e cem vezes mais intenso que a morfina.
O Hospital das Clínicas de São Paulo acabou de inaugurar o primeiro ambulatório do país destinado ao tratamento de dependentes de opioides. A proposta é que o local receba tanto pacientes que se tornaram dependentes após tratamentos prescritos por médicos quanto aqueles que fazem uso recreativo dessas substâncias, pois esse já é um problema de Saúde Pública, fruto de dois aspectos, um mais nobre, que é o combate ao sofrimento causado pela dor, e outro que consiste no uso recreativo por jovens induzidos pelo narcotráfico e que são vítimas da abstinência. A dor física avilta a vontade de viver e a qualidade de vida, e o vício alimenta o vazio da alma, que, na sede de procurar abrigo, se socorre no tráfico. Ambas as situações dolorosas merecem respeito, e a iniciativa do HC vem para dar apoio a esse grave problema mundial.

Fernando Rizzolo é advogado, médico, membro efetivo da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP

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