José Renato Nalini
O Brasil precisa ser exorcizado. Não há outra explicação para a série de horrores sofrida nestes tempos. Destruição da floresta amazônica, incêndio no Pantanal, agressão a todos os biomas, invasão de terras indígenas, cedidas à exploração selvagem, desmanche das estruturas de tutela ambiental. Ou seja: acelerado extermínio do futuro.
Não é só. Como conviver, no país do “agro é pop, agro é tudo”, com mais de vinte milhões de brasileiros passando fome, enquanto outros muitos milhões padecem igualmente de insegurança alimentar?
Além do desemprego que avança cruel, recessão e estagflação já estão fazendo companhia à sofrível economia tupiniquim. Por isso é que os brasileiros que podem fogem rumo à civilização. Primeiro foi fuga de cérebros, diante do desinvestimento em pesquisa e cultura. Depois foi a diáspora dos desempregados. Agora é a classe média que quer respirar ares menos poluídos.
Não é preciso um exorcismo para refrear a “aura sacra fames” dos políticos profissionais? Faz sentido um Fundo de quase seis bilhões para alimentar a vaidade, enquanto irmãos morrem de inanição e de Covid?
Somente um exorcismo para que o Brasil reflita em torno à violência que sacrifica dezenas de milhares de jovens a cada ano. Exorcismo para que as armas, instrumento letal, feito para matar, sejam banidas e deixem de ser fabricadas.
Exorcismo para inibir as mentiras, as falsidades, a maledicência, o egoísmo, a ironia, o sarcasmo, o deboche, que grassam nas redes sociais e que distanciam as pessoas, fazendo com que cada qual fique no seu “cercadinho”, onde aquele que pensa de forma diversa não pode chegar.
A mais inteligente estratégia do demônio é fazer as pessoas acreditarem que ele não existe. Assim como fazê-las negar o valor da ciência, repudiarem a vacina e a proteção contra o vírus que já levou mais de seiscentos mil e que chegará, com as novas cepas, a matar mais de um milhão de semelhantes. Por isso hão de ser convocados os exorcistas, mas também os crentes de outras confissões, as pessoas de boa vontade e todas aquelas que sonham com um Brasil melhor. Mais humano, mais fraterno, mais unido. Pensando nesse país dos nossos sonhos é que devemos exorcizar o Brasil.
José Renato Nalini é reitor universitário, docente de pós-graduação e presidente da
Academia Paulista de Letras
