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Capacitismo: ver além da deficiência

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Kelli Aparecida da Silva Pontes

Milhares de pessoas no Brasil, segundo o IBGE, têm algum tipo de deficiência. São pessoas que apresentam alguma limitação a médio ou longo prazo, seja ela de natureza mental, física, intelectual ou sensorial, e que podem estar sujeitas a inúmeras formas de preconceito e/ou discriminação, inclusive por falta de equidade.
Muito se fala sobre preconceito, que significa pré-julgamento a respeito de algo/alguém, e sobre discriminação, que é o ato de pôr à parte e/ou isolar o outro, mas pouco se aborda o tema capacitismo.
Afinal, o que é capacitismo? É o preconceito ou a discriminação contra pessoas com deficiência, expressado por crenças, palavras e ações que subestimam a individualidade, as capacidades e aptidões que a pessoa possui ou não devido à deficiência. São expressões ou atitudes, ainda que imperceptíveis, que se enquadram no termo capacitismo.
Observa-se, por meio de muita luta, que essa estrutura social que estigmatiza a pessoa com deficiência como alguém incapaz já passou por diversas evoluções, mas há muito a se conquistar para que o “capaz” não seja somente aquele que não evidencia suas limitações, ou seja, o suposto “perfeito” e “normal”. Ninguém é perfeito, todos têm a sua limitação e, de alguma maneira, busca superar enquanto aprende a se colocar no mundo sem o fardo do julgamento alheio.
Abordar temas sobre capacitismo é despertar a sociedade para refletir sobre o mundo que a cerca, principalmente, através de suas expressões e atitudes no cotidiano, que, por muitas vezes, desqualificam o ser humano em razão de suas características e, consequentemente, podem gerar um adoecimento emocional irreversível.
Quando a intenção e atitude do ser humano não está baseada na crueldade, os danos emocionais podem ser evitados, e o melhor caminho é trazer à luz quais expressões e atitudes que devem ser repensadas, modificadas ou ajustadas. Pois, ainda é possível acreditar que a sociedade falha por falta de conhecimento.
No dia a dia, entre tantas frases enraizadas e consideradas comuns, quem nunca justificou um comportamento inadequado ou impulsivo ao alegar estar “cego de raiva” ou não foi exortado de que “desculpa de aleijado é muleta”? Num primeiro momento, por serem aparentemente inofensivas, frases como essas podem ser interpretadas com naturalidade por aqueles que a praticam, mas, para aqueles que possuem tais características, são frases opressoras, pois cada uma delas denotam uma correção, uma justificativa para um erro, ou falha utilizando as condições de uma deficiência a uma comparação pejorativa.
Além das expressões, o capacitismo pode se manifestar também por atitudes como: tomar a iniciativa de ajudar quando não há um pedido, pois quem deve determinar se precisa ou não de ajuda é o próprio indivíduo; falar ou ter atitudes que transmitem excesso de proteção e, muitas vezes, infantilizadas; admirar ou ficar perplexo porque uma pessoa com deficiência conseguiu graduar, trabalhar ou casar-se. São realizações que qualquer outra pessoa pode fazer, não é algo surreal.
Essas expressões e atitudes capacitistas, às vezes, não têm a intenção preconceituosa ou discriminatória, uma vez que observa-se uma consciência empática. Porém, é necessário também educarmos a forma como nos portamos, com gestos, palavras, e expressões, diante daqueles que possuem alguma deficiência, para que sejamos respeitosos e inclusivos.
O caminho para construir uma sociedade anticapacitista é, sem dúvida, promover conhecimento para evitar falhas. Caminho esse que deve iniciar no âmbito familiar e se estender aos demais vínculos sociais, como escola, igreja, trabalho, entre outros espaços.
Falar sobre capacitismo é dar voz e visibilidade às pessoas que podem realizar tudo o que desejam, apenas de maneira diferente, conforme suas particularidades e individualidades, sem a necessidade de provar ou impressionar sobre o quanto é capaz. É lutar para que a deficiência nunca esteja à frente da pessoa!

Kelli Aparecida da Silva Pontes é psicóloga e pós-graduada em saúde mental. Atua como psicóloga clínica e organizacional na Fundação João Paulo II