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Por organização administrativa dos bairros em Osasco, vereadores ‘suspendem’ efeito de decisão da Prefeitura

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O mapa da discórdia: os bairros definidos pelo ex-prefeito Jorge Lapas foram anexados ao Decreto de 2014 - Foto: Anexo ao Decreto nº 11.042

Na sessão da Câmara Municipal de Osasco de terça-feira da semana passada, dia 6 de junho, os vereadores aprovaram em segundo turno – portanto, de forma definitiva – o Projeto de Decreto Legislativo nº 05/2021 que trata da divisão político-administrativa do município; ou seja, a denominação dos bairros de Osasco.
Inicialmente, a assessoria de Comunicação da Câmara divulgou que a aprovação da proposta permitiria a “revogação” de um decreto de 2014, do então prefeito Jorge Lapas (PDT), que teria gerado conflito em relação à denominação dos bairros da cidade. Depois de consulta da reportagem do jornal Página Zero, a assessoria corrigiu a terminologia, informando que os efeitos daquele decreto serão “suspensos” ou “paralisados” em razão do novo Decreto Legislativo.

A RECLAMAÇÃO

O Projeto aprovado é de iniciativa do vereador Zé Carlos Santa Maria (Patriota), que apresentou o texto afirmando atender a reivindicações da comunidade. “Esse decreto [o da Prefeitura] foi criado no governo passado e mudava o nome de todos os bairros da cidade. Espero que o prefeito Rogério Lins aceite o Projeto [da Câmara], porque esse é um pedido da população”, explicou.
De acordo com o vereador, o decreto de 2014 trouxe confusão à população, porque mudou o nome de bairros tradicionais.
As alegações do parlamentar foram referendadas por outros vereadores, como Josias da Juco (PSD), lembrando que o tema é alvo de debates frequentes na Câmara e que a mudança nos nomes de bairros provoca transtornos nas entregas dos Correios e até mesmo na variação do preço do seguro de automóveis. Josias citou como exemplo o bairro Jardim Sindona, que foi englobado pelo bairro Jaguaribe. “A família Sindona me procurou. Ela doou área para fazer escola, praça e o nome do bairro foi esquecido”, exemplificou.
Situação semelhante acomete a Olaria do Nino, segundo Laércio Mendonça (PSD). “Reforço a importância desse Projeto. Nasci na Olaria do Nino. Não é bairro e hoje tenho que me referir a ele como Conceição”.

DESDE 1990

A questão da divisão político-administrativa do município de Osasco que passou a virar polêmica na Câmara de Osasco data de 1990. Em 26 de março daquele ano o então prefeito Francisco Rossi de Almeida publicou a Lei nº 2.223/90 definindo 60 bairros em Osasco e anexando uma planilha de todos eles à legislação.
Em 2014, a mesma Câmara Municipal aprovou o Projeto de Lei (PL) nº 29/2014 do então vereador Jair Assaf, que revogava totalmente aquela lei de 1990. Sancionado pelo prefeito Lapas, o novo dispositivo recebeu o nº de Lei 4.654, de 6 de outubro de 2014, criando inclusive o Artigo 2º definindo que “Fica delegado ao Poder Executivo [Prefeitura] estabelecer por decreto, para efeitos puramente político-administrativos, a divisão do município de Osasco em setores, com a denominação de bairros”. Ou seja: além de revogar a lei antiga, a nova legislação permitia ao prefeito fazer as modificações que julgasse necessárias na divisão dos bairros. Essa lei, no entanto, não tratava especificamente sobre cada um deles.
Foi somente um mês depois, em 13 de novembro de 2014, que o mesmo prefeito Lapas publicou o Decreto nº 11.042 que, na prática, tinha apenas a missão burocrática de nomear uma comissão – chamada de Grupo de Trabalho – “com o objetivo de viabilizar a definição dos bairros do município”.
Realmente, o Decreto citava o nome de seis pessoas que fariam parte do Grupo de Trabalho, determinava um prazo de 180 dias para conclusão dos trabalhos, mas inexplicavelmente, antes mesmo de a tarefa ser encerrada, já anexava ao próprio Decreto – em seu artigo 5º – um novo mapa com definições sobre os bairros da cidade. Dizia o artigo 5º do Decreto: “Os limites, confrontações e denominações dos bairros são os constantes da planta anexa que, para todos os efeitos, passa a fazer parte integrante deste Decreto”.
Não se tem notícia se o Grupo de Trabalho cumpriu os prazos e se elaborou estudos que modificassem aquele mapa anexado ao Decreto, mas é ele (o mapa) que estaria contrariando os vereadores.

O PODER DO DECRETO LEGISLATIVO

Também não se sabe ao certo se o mapa anexado pelo prefeito Jorge Lapas apresenta grandes diferenças em relação àquele implantado por Francisco Rossi, em 1990. A iniciativa dos vereadores, então, em suspender os efeitos daquele decreto de 2014, em vez de promover um novo estudo ou novo mapeamento atualizado, apenas teria a função de cancelar o mapeamento mais atual retornando à divisão mais antiga.
Mas também aí surge outra questão: o Decreto Legislativo aprovado pelos vereadores teria a força legal para revogar, suprimir, suspender ou paralisar os efeitos de um decreto do Poder Executivo?
O atual prefeito Rogério Lins (Podemos), como chefe do Executivo, não poderia – ou deveria – ser instado pelos vereadores a revogar os termos do Decreto emitido pelo mesmo Poder Executivo?
Nem a Lei Orgânica do Município e nem o Regimento Interno da Câmara apontam claramente situação legal nesse sentido. Tanto o artigo 43 da Lei Orgânica, como o Artigo 215 do Regimento Interno apenas citam para o que serve um Decreto Legislativo, mas nenhum deles se refere à possibilidade de suspender os efeitos de um Decreto do Executivo, taxativamente.
A Procuradoria-Geral da Câmara Municipal encontrou respaldo nas Constituições federal e estadual paulista, para considerar pelo menos o Decreto Legislativo legal. Em ambos os casos, no entanto, se apega a termos subjetivos de que o Decreto Legislativo tenha força de “sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa” (inciso V, do art. 49 da Constituição Federal).
Em resumo, significa dizer que, sempre que o Poder Legislativo considerar que houve exagero por parte do Poder Executivo, esse mesmo Legislativo poderá sustar as ações do Executivo.
Se o raciocínio vale para este caso específico, prefeitos, governadores e presidentes passarão a temer sobre o julgamento dos que os legisladores possam considerar “exagero” ou que “exorbitem” os limites.
Pela crença dos vereadores e da Câmara Municipal de forma geral, a aprovação e publicação do Decreto Legislativo, por si só já susta os efeitos daquele Decreto de Jorge Lapas de 2014. O principal atingido, neste caso, seria então o Poder Executivo, que teria em mãos um Decreto assinado por um prefeito durante o gozo de suas atribuições, e que, de uma hora para outra estaria sem validade, impondo à própria Prefeitura outra legislação que não aquela implantada de forma legal.
Para saber se o prefeito Rogério Lins já teria posição assumida sobre o tema, a reportagem do jornal Página Zero enviou consulta ao seu setor de Comunicação, com duas perguntas básicas: se ele iria se abster, reconhecendo que e lei antiga passa a vigorar por conta da “preferência” dos vereadores ou se, como chefe do Executivo ele iria obstar tal iniciativa, defendendo as prerrogativas de seu próprio poder executivo.
Ao fechamento desta edição, na tarde de quinta-feira, 15/6, a assessoria do prefeito Lins respondeu ao e-mail do jornal Página Zero com a seguinte informação: “A Prefeitura não foi notificada pelo Legislativo sobre a discussão e aprovação da Câmara e irá manifestar-se somente após isso”.