Levantamento do TCE-SP aponta que municípios paulistas receberam R$ 760 milhões em repasses via ‘Emendas Pix’ entre 2022 e 2023
O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) divulgou nesta semana o encerramento de um levantamento, realizado em setembro último, apontando que,
entre janeiro de 2022 e agosto deste ano, 565 das 644 cidades paulistas fiscalizadas pelo setor receberam R$ 760 milhões por meio das chamadas “Emendas Pix”, utilizadas para a liberação de recursos orçamentários diretamente aos Executivos locais. O valor empenhado para essas emendas no período, entretanto, ultrapassa a marca de R$ 1 bilhão.
SEM TRANSPARÊNCIA
As quantias incluem transferências estaduais e federais, regulamentadas por normativos que não exigem a celebração de convênios ou contratos nem prestações de contas. O documento aponta que “ao mesmo tempo em que a descentralização adotada com as Transferências Especiais (Emendas Pix) permite maior agilidade nos mecanismos de repasses, desburocratizando procedimentos e possibilitando liberdade de aplicação aos gestores locais na aplicação de valores, torna-se temerária a ausência de normativos específicos disciplinando a transparência das prestações de contas dos gastos realizados”.
O impacto da falta de publicidade, segundo o Tribunal, “é evidente”. Pelo levantamento apurado pela fiscalização nos sites da transparência dos governos federal e estadual, apenas 6% dos repasses federais feitos no ano passado tiveram suas prestações de contas divulgadas. Não há dados disponíveis sobre as emendas estaduais.
“Da forma como as coisas estão hoje, os gestores acabam não indicando claramente o destino dos recursos. Sem a demonstração adequada do uso das verbas transferidas, o controle externo e a sociedade não podem exercer o seu papel fiscalizatório”, disse o presidente do TCE-SP, Sidney Beraldo.
A checagem ainda mostra que, em 2022, as emendas estaduais chegaram a R$ 74 milhões empenhados e totalmente pagos (435 emendas para 271 cidades) e, até 1º de setembro de 2023, a quase R$ 110 milhões (valor pago por meio de 271 emendas para 178 municípios).
Já os repasses federais empenhados atingiram a soma de R$ 307 milhões em 22 (totalmente liberados por 1.012 emendas para 523 cidades) e de R$ 570 milhões (apenas R$ 270 milhões pagos via 809 emendas destinadas a 428 municípios) este ano.
O levantamento feito pelo Tribunal revela também que muitas prefeituras ignoram a obrigatoriedade de abertura de contas bancárias específicas para esses depósitos.
“O governo federal exige que seja criada uma conta por exercício. No Estado, nem isso existe, já que temos uma conta única pa ra receber todas as emendas desse tipo, o que dificulta muito o nosso trabalho”, declarou Beraldo.
ALERTA AOS GESTORES
Diante disso, o Tribunal emitiu alerta aos gestores, reiterando as vedações previstas quanto à aplicação desses recursos em despesas com pessoal, encargos sociais e encargos referentes ao serviço de dívidas.
“Ainda que a legislação específica sobre esse tema seja insuficiente, os gestores têm obrigação, como administradores públicos, não só de promover a devida contabilização do dinheiro recebido, mas também de dar publicidade sobre o uso desses recursos. É importante destacar que isso será levado em conta no exame das contas anuais”, explicou o presidente. “Para o Tribunal, quem não fizer isso está cometendo uma falha grave. Podemos multar os responsáveis e ainda acionar o Ministério Público”, completou.
CARAPICUÍBA, A CAMPEÃ
Em julho deste ano, o jornal “Estadão” publicou matéria sobre o tema, apontando que a cidade de Carapicuíba se transformou num reduto de recursos sem transparência indicados por parlamentares, por meio das emendas Pix. Segundo o levantamento do periódico, o município é o que mais recebeu esse tipo de verba nos últimos três anos no Brasil. A cidade teria sido beneficiada com R$ 133 milhões em indicações parlamentares entre 2020 e 2023. Desse valor, R$ 66 milhões foram efetivamente transferidos para os cofres da administração municipal, superando qualquer outra cidade do Brasil. Os recursos foram enviados a pedido do prefeito Marcos Neves (PSDB).
O dinheiro cai direto na conta da Prefeitura, sem planejamento nem transparência, diferentemente de outros repasses. A emenda Pix foi “turbinada” após o Supremo Tribunal Federal (STF) declarar o orçamento secreto inconstitucional. Por meio desse tipo de emenda, os parlamentares destinam os recursos aos municípios, mas cabe à Prefeitura fazer licitações, definir preços de produtos e serviços e selecionar as empresas fornecedoras.
O resultado dessas ações, de acordo com o jornal, é que a Prefeitura de Carapicuíba teria pago mais caro por asfalto, reforma de praça e até carrossel de brinquedo, enquanto deixou escolas com obras paralisadas ou atrasadas.
Fiscalização Ordenada
A chamada Fiscalização Ordenada, promovida pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP), resultou num relatório final de 60 páginas. Segundo o setor, foram envolvidos 111 servidores no Tribunal na fiscalização que apurou dados em 100 municípios paulistas, com o processamento de 132 quesitos.
O trabalho teve o seguinte escopo principal:
– A qualificação dos responsáveis pelo recebimento, controle e aplicação dos recursos recebidos:
– A verificação da correta contabilização das transferências recebidas e correspondentes despesas realizadas;
– O exame da movimentação financeira dos recursos em contas bancárias específicas;
– A regularidade das despesas com investimento e custeio pagos com as Emendas;
– A fiscalização da finalidade e destinação das transferências recebidas;
– Observas a transparência e controle social do total das transferências especiais.
Obs.: O Relatório do TCE-SP pode ser conferido na íntegra pelo link https://bit.ly/3Fu0Xe8.