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Convencer o gaúcho a não deixar o RS

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Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves

Felizmente a água está baixando em Porto Alegre e nas demais localidades gaúchas assoladas pelas cheias que duraram todo o mês de maio, cujos danos estão agora expostos e carecem restauração. Socorridos ou pelo menos encaminhados, os sobreviventes, os governos precisam se movimentar após a formidável demonstração de solidariedade de todo o Brasil para com os irmãos flagelados. Surge agora um problema adicional: o êxodo. Governos e as forças da sociedade gaúcha organizada preocupam-se com a possiblidade de que os atingidos – mesmo com todo o amor que têm pelo torrão natal – busquem outros lugares mais seguros para continuar a vida e descendência.
É tradicional a migração de gaúchos – com sua força de trabalho para outros pontos do país. Muitos deles são encontrados com florescentes negócios no Brasil central e outras áreas que um dia lhes foram mais favoráveis para fazer sua vida do que o próprio Estado sulista. Agora é um momento crítico que os sofridos chefes de família precisam encontrar segurança para permanecer. Além de ajudados a recompor suas moradias e fontes de renda, carecem ser convencidos de que onde forem realocados não estarão arriscados a sofrer o mesmo infortúnio que os levou ao atual estado de desabrigo e penúria. Não esqueçam as lideranças riograndenses que a tragédia das águas se abateu três a quatro vezes no último ano, cada vez mais devastadora. E é necessário colocar um fim nesse estado de coisas.
Existem os municípios interioranos cujas próprias autoridades não têm certeza quanto a reconstruir sua sede no mesmo lugar ou deslocá-la para ponto mais alto e seguro. Esses precisam ser apoiados na decisão. O noticiário dos últimos tempos registra a existência de barragens problemáticas que ameaçavam ruir. O acidente ocorreu e potencializou o problema das cheias. O Estado carece de mais cuidados com essas obras que são fundamentais ao desenvolvimento, mas perigosas quando fora de conformidade. Há a questão da manutenção das obras hidráulicas. Não só as barragens, mas principalmente o muro de Porto Alegre, que foi construído em razão do conhecimento de que o rio, quando cheio, é mais alto do que a cidade e causa inundações. Todos os equipamentos do muro e as estações de bombeamento têm de estar em plenas condições de funcionamento dia e noite, durante os 365 dias do ano.
O gaúcho, empreendedor e detentor de grande força de trabalho tem levado aquele Estado a grandes produções agrícolas. É preciso, no entanto, que as forças institucionais e da própria sociedade cuidem da salubridade do ambiente para que ele se sinta seguro e fique  sem o sobressalto daquele que tem a figura da espada sobre a cabeça. Espada essa representada pela água que pode chegar e levar tudo a qualquer instante. Todos os recursos técnicos e econômicos devem ser empregados nessa normalização e salubrização do território. Evitar que o gaúcho, judiado em sua terra, vá empregar sua força e produzir riquezas em outras plagas.
Espera-se que, sem demora, União, Estado e municípios estejam falando a mesma linguagem e concretizando as promessas feitas à população flagelada no difícil momento em que o mais importante era salvar a própria vida. Agora é hora de reconstruir o habitat ou, sem isso, o grande e tradicional Estado e o Brasil terão muito a perder.
Além do socorro ao Rio Grande do Sul, precisamos de um programa nacional que evite o descontrole das águas e encostas. Há muito o que fazer para evitar que rios saiam de sua calha, pois foram séculos de maus-tratos. Mas é preciso começar porque, a cada ano que passa, maiores serão os danos e as vítimas a lamentar. A União, que arrecada a maior parte dos tributos deve entrar com os recursos, o Estado oferecer apoio técnico e os municípios executar as obras de acordo com o estabelecido nos projetos. Não há outra alternativa.
Lembremos que desde 2012 está legalmente prevista a montagem do Plano Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNDC), cuja função será identificar as áreas sujeitas a riscos de desastres. Passada mais de uma década de sua concepção, o programa ainda não saiu do papel. Não serviu para o Rio Grande do Sul, mas ainda deverá atender ao resto do país.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves é dirigente da Associação de Assistência Social dos Policiais Militares de São Paulo (Aspomil)