Luiz Carlos Borges da Silveira
O Brasil pode acabar ainda este ano com o instituto da reeleição para os cargos executivos: presidente da República, governadores e prefeitos. O fim da possibilidade de um segundo mandato consecutivo será culpa dos próprios políticos que não entendem sua importância e defraudam completamente o sistema.
Para revogar a reeleição é necessária uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) e já existe no Senado projeto nesse sentido em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Como o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, é favorável, provavelmente a tramitação não encontrará resistência ou delongas. Vale lembrar que para efeito legal, alterações na legislação eleitoral devem ocorrer com pelo menos um ano de antecedência da próxima eleição. Aliás, está em discussão no Congresso a possibilidade de que os prazos para aplicação da norma sejam negociados por ocasião da votação da matéria, segundo declarou o presidente do Senado.
Ao que parece, desta vez há clima favorável para modificar a legislação, as lideranças políticas se convenceram que a reeleição é inadequada; no Brasil não há tradição nem cultura política para tal sistema. Exemplos e fatos constantemente comprovam isso. Reeleição não é boa para a política e principalmente para o país, para estados e municípios.
Argumentos que mostram ser a reeleição prejudicial: o presidente da República, por exemplo, desde o início de seu mandato está focado na campanha para garantir um segundo período. Isso compromete a gestão pública, prejudica o governo porque o governante faz gastos e aumenta despesas com projetos e ações populistas cujo objetivo é conquistar a popularidade e a simpatia junto ao eleitorado. Acaba deixando um legado de dívidas, obras inacabadas e compromissos ao sucessor.
Entre os exemplos mais evidentes pode ser citado o governo Dilma Rousseff, que deixou o país em situação extremamente frágil, comprometido por conta de medidas populistas que visavam suprir a falta de empatia eleitoral e reverter a enorme rejeição que enfrentava. Tudo por um novo mandato. O resultado disso foram os anos seguintes de desorganização do Estado e descontrole da economia.
Mais recentemente, o então presidente Jair Bolsonaro viveu empenhado numa cruzada com a mesma intenção: ser reeleito. Para compensar ações desastradas e graves arranhões de imagem, adotou medidas e posturas populistas, demagógicas, a maioria delas a custa do orçamento público. Bolsonaro ameaçou extinguir o Bolsa Família, porém depois não somente o manteve como também aumentou seus valores visando beneficiar-se desse programa popular e paternalista.
Com certeza, o uso da máquina e do dinheiro público em campanhas por um segundo mandato não é mal que atinge apenas presidentes. Há inúmeros casos semelhantes nas administrações estaduais e municipais, cada um na sua proporção.
É claro que o instituto da reeleição não é, em si mesmo, catastrófico. Muitas democracias no mundo o adotam. Ocorre que os políticos brasileiros não conhecem limites. Tanto, que a compra de votos e barganhas no Congresso são ilícitos que já não assombram ninguém nem fazem político corar de vergonha. Até o então presidente Fernando Henrique Cardoso fez os maiores esforços para aprovar a emenda da reeleição a ponto de lançar mão de um inescrupuloso toma lá, dá cá, para cooptar parlamentares venais que endureciam a falsa oposição para negociar o próprio voto. FHC foi beneficiado pela PEC 16/1997, pois pôde se reeleger no ano seguinte.
Em minha opinião, seria oportuno aproveitar a discussão da matéria e promover outras modificações no sistema eleitoral. Entre elas, desvincular as eleições executivas das legislativas, como acontece nos EUA e na França, em que num ano é realizada eleição para mandatos executivos e dois anos depois o pleito para renovação parlamentar.
Isso traria também ganho na eficiência da gestão municipal, porque atualmente o prefeito eleito trabalha dois anos com um presidente da República e um governador de estado e os outros dois anos com presidente e governador que podem ser de partido e linha política diferentes, dificultando o entrosamento administrativo e execução de projetos e obras. Quem conhece a política sabe o que isso representa. A coincidência de mandatos acabaria com esse risco.
Enfim, entendo que a reeleição é problemática e acabar com ela implica em reduzir mandatos. Lideranças de peso questionam essa redução argumentando que quatro anos é pouco tempo para executar um programa de governo. O presidente Lula afirma que mesmo cinco anos é período insuficiente como mandato.
Então, que se estabeleça a mudança para seis anos, um período bem razoável. E na metade dos mandatos executivos ocorreria a eleição legislativa para senadores, deputados federais e estaduais e para vereadores. Portanto, eleição de três em três anos e não de dois em dois como atualmente. Seria um arranjo democrático, com possibilidade de agrado geral, e uma alternativa até que a política brasileira tenha efetiva moralidade e atuação dedicada ao desenvolvimento do Brasil e bem-estar dos brasileiros.
Luiz Carlos Borges da Silveira é empresário, médico e professor. Foi ministro da Saúde e deputado federal