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Homenagens: só ao poder

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José Renato Nalini

Desde cedo percebi que o ser humano tende a ser imediatista e interesseiro. Bajula quem pode ajudá-lo. Despreza aquele que, eventualmente, venha a necessitar de ajuda. Por isso, mais de uma vez escrevi sobre a indisfarçável e escusa manobra de reverenciar o poderoso, chamando-a “tática das homenagens”.
É o assédio falso a quem dispõe de cargos, funções ou autoridade. O núcleo comum é a parcela de poder de que se poderá extrair qualquer proveito. Inclusive aquele de uma aproximação que traduza familiaridade com o núcleo decisório. Mero deleite da vaidade, a vã e inafastável companheira do ser humano invejoso.
Raras, por isso, cada vez mais excepcionais, as iniciativas tendentes a cultuar vultos notáveis, que deveriam servir para recordar às gerações vindouras os verdadeiros valores, aqueles intangíveis e que não podem ser contabilizados no “toma-lá-dá-cá” das relações interesseiras.
A preferência é cortejar quem está por cima. Aí vale tudo. Encontra-se fundamento e razão para as mais servis curvaturas da espinha dorsal. Mas compare com a esperada troca de bastão. Aí é o recém-ungido o merecedor daquelas honrarias.
Quem se ilude com o cordão bajulador se assusta ao ser afastado da cúpula, ainda que ela seja uma pequena, mísera expressão de poderio.
Cumpre a quem está ascendendo recordar-se da lição evangélica: vaidade, tudo é vaidade. Ler com atenção o discurso sobre a vaidade dos homens, de Matias Aires. Lembrar-se da tão veraz lenda do asno que carregava relíquias na procissão e que acreditava que as genuflexões eram feitas para ele e não para o Santíssimo.
Reler com carinho o conto do “Príncipe Feliz”, cuja estátua restou abandonada no decorrer de poucos anos e que serviu de pouso para uma andorinha que se condoeu da tristeza de quem, depois de morto, enxergava a realidade de seu reino. Genial Oscar Wilde, a exprimir a mesquinhez dos homens e a detectar, com tamanha sensibilidade, o significado das honras passageiras.
Nenhuma perspectiva de salvação da alma da criatura racional que continua a comportar-se irracionalmente, na crença vã de que sobreviverá ao final dos tempos e de que suas artimanhas conseguirão enganar a todos.

José Renato Nalini é professor e presidente da Academia Paulista de Letras